O artista estava internado no Hospital Barra D’Or, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro
Erasmo Carlos morre aos 81 anos, nesta terça-feira, dia 22. Ele estava internado no Hospital Barra D’Or, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. A causa da morte ainda não foi divulgada. Ele deixa a esposa e três filhos.
No começo de novembro ele havia recebido alta do mesmo hospital e comemorou nas redes sociais “Bem simbólico. Depois de me matarem no dia 30, ressuscitei no Dia de Finados e tive alta do hospital”, ironizou o cantor sobre os boatos de que ele teria morrido.
Recentemente, o artista ganhou o Emmy Latino 2022 na categoria Melhor Álbum de Rock ou de Música Alternativa em Língua Portuguesa com a obra “O Futuro Pertence À… Jovem Guarda”.
O início
Seus primeiros passos na música se deram ainda na década de 1950, quando formou o quarteto The Snakes ao lado de Arlênio Lívio, José Roberto China e Edson Trindade. Os três eram ex-integrantes do grupo The Sputniks, no qual haviam tocado junto com Tim Maia e Roberto Carlos.
Foi por volta daquela época que Erasmo se deparou pela primeira vez com aquele que seria um de seus grandes parceiros na música. “Eu estava lá em casa, na Tijuca, e um amigo em comum bateu na porta com o Roberto Carlos. ‘Queria te apresentar um amigo que é cantor’. Já conhecia ele da televisão. Eu colecionava muitas letras de música, fotos de artistas de rock and roll, e ele precisava de uma letra que eu por acaso tinha”, lembrava, ao Fantástico, em 2013.
“Era Hound Dog, de Elvis Presley. Ficamos conversando e rolou um papo legal de rock. Ele falou: ‘Aparece lá pela televisão’. Aí eu comecei a sair do trabalho, ir para lá, só para ver. Eram 15 minutos de programa. Fui ficando amigo da equipe, das dançarinas, os músicos. Daqui a pouco já comprava um sanduíche para o Carlos Imperial, conhecia o porteiro, entrava direto. Aí que o Imperial me chamou para ser secretário dele”.
“Com o Roberto Carlos, também, a gente foi convivendo e ficando amigo. Muitas brigas, por exemplo, de turmas, mas que nos aproximaram muito. Aquela coisa de ‘brigamos juntos’, sabe? Dessa amizade de amigo, a gente foi se identificando musicalmente, também. Com meu conjunto vocal, fui fazendo coro para ele. Até o dia em que nós resolvemos fazer uma música, um rock em português, Parei na Contramão”, continuava.
Anos depois, ao lado de Roberto e Wanderléa, Erasmo Carlos foi um dos apresentadores do histórico Jovem Guarda, programa da TV Record exibido entre 1965 e 1968. Em seu palco, passaram grandes nomes da música brasileira, que à época faziam sucesso com o público jovem. Além do trio, destacaram-se nomes como Ronnie Von, Wanderley Cardoso, Vanusa, Sérgio Reis, Jerry Adriani, Fred Jorge e grupos como Renato e seus Blue Caps, Os Incríveis e Golden Boys. Nessa época, compôs o clássico Festa de Arromba.
“Na Jovem Guarda ninguém fumava nem bebia. Só depois experimentei maconha e outras drogas, como ácido, mas só duas ou três vezes”, garantia, em entrevista ao Estadão, em 2009.
Parceria
Fosse na época da Jovem Guarda ou nas décadas seguintes, Erasmo participou da composição de muitos dos sucessos que se popularizaram na voz de Roberto Carlos. Entre eles, Calhambeque, Eu Sou Terrível, Detalhes, O Divã, Além do Horizonte e Cama e Mesa.
Em 1974, a dupla criou uma melodia para uma canção religiosa, mas não conseguiram concluir a música, que acabou engavetada. Três anos depois, Roberto, emocionado com a ida de Erasmo à sua festa de aniversário surpresa, escreveu a letra de Amigo durante viagem a Los Angeles. “Você meu amigo de fé, meu irmão camarada/Amigo de tantos caminhos e tantas jornadas/Cabeça de homem, mas o coração de menino/Aquele que está do meu lado em qualquer caminhada”, diz a letra, feita em homenagem a Erasmo Carlos.
Sobre ter que lidar com o fato de seu colega, Roberto, ser chamado de “Rei” ao longo dos anos, Erasmo Carlos dizia que não se incomodava. “Eu sou um compositor. O que eu sempre sonhei, a partir do momento que eu gostei de música, foi ser compositor, um criador. Jamais me passa pela cabeça o negócio de ser cantor, sabe? Eu canto por circunstância”.
“Por isso posso dizer, da minha parte, nunca houve o mínimo incômodo de o Roberto Carlos ser o ‘Rei’. Não, eu sou compositor. É isso que eu quero ser, o que eu sempre quis ser. Tudo que eu tenho na minha vida é em função do que eu sou e gosto de ser. Se eu não cantar, eu não me importo. A minha realização não é estar em um palco cantando, é eu estar com meu violão compondo”, explicava em entrevista a Marília Gabriela no GNT, em 2010.
Fato é que nas muitas vezes em que mostrou seu lado cantor, fosse com músicas próprias ou compostas por outros artistas, Erasmo Carlos fez sucesso, como em Mesmo Que Seja Eu, Gente Aberta, É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo, Pode Vir Quente Que Eu Estou Fervendo, Sentado à Beira do Caminho, Minha Fama de Mau, Mulher (Sexo Frágil) e De Noite na Cama.
Ao longo dos anos, tornou-se referência para inúmeros músicos. E recebeu homenagens, como na canção Tremendão é Tremendão, do grupo Funk’n’Lata. Em 1998, Ivo Meirelles explicava o motivo para a admiração, à Folha de S. Paulo: “Erasmo é autêntico. Não é marketeiro. Por isso o mercado não lhe dá o devido valor e ele está há anos sem gravar”.
Vida pessoal
Erasmo Carlos também se envolveu em algumas polêmicas ao longo dos tempos. Em 15 de janeiro de 1967, por exemplo, reagiu a provocações de um rapaz na plateia de seu show no Clube Recreativo Sorocabense, no interior paulista. Precisou de ajuda da polícia para sair do local. Mesmo assim, seu carro foi perseguido na rodovia Raposo Tavares e acabou sendo alvejado por seis tiros.
Em 4 de junho de 1984, sua então esposa, Narinha, foi atingida por um tiro quando estava em casa. A bala atingiu partes de seu estômago, baço, pulmão e intestino. A arma era propriedade de Erasmo Carlos e estava guardada em um closet. Segundo os relatos da época, o cantor estava no 1º andar com outros membros da família quando ouviu o disparo.
“A cena mais desesperadora que já vi em minha vida”, contou, na ocasião. Dias depois, quando ela se recuperou, confirmou a história de outras testemunhas de que havia sido um acidente, fazendo com que a polícia não abrisse uma investigação por possível tentativa de homicídio ou suicídio. Os dois se separaram em 1990, após 13 anos casados. Aos 49 anos, no fim de 1995, Narinha morreu. Laudos posteriores do IML revelaram que ela ingeriu veneno (cianeto de potássio).
Erasmo Carlos se casou novamente em 2019, com Fernanda Passos, após sete anos de relacionamento. Em entrevistas, o artista já ressaltou que não se incomoda com a grande diferença de idade entre eles, de 49 anos.
O cantor era pai de Leo Esteves, Gil Eduardo e Carlos Alexandre Esteves, o Gugu, que morreu dias após um grave acidente de moto em maio de 2014. Na ocasião, durante o período em que o filho passou oito dias em coma induzido, Erasmo seguiu se apresentando e relatou ao <b>Estadão</b>: “O show não pode parar, bicho. Eu e meus filhos trabalhamos com música e temos um pacto: o que acontece com um não pode impedir os outros de seguir em frente. Entendo que outras pessoas parem suas vidas para chorar, mas isso não resolve. Você pode mandar pensamentos positivos a todo instante, de qualquer lugar”.
Em 2004, lamentou a morte de sua mãe, dona Maria Diva, a quem considerava como “mãe e pai” por conta do apoio durante a infância: “Ela foi uma guerreira e batalhou muito para me criar sozinha quando veio, já grávida, da Bahia”.
No cinema
O cantor também participou do elenco de alguns filmes. A estreia se deu em Roberto Carlos e o Diamante Cor-de-Rosa, gravado em 1968, mas lançado em 1970. Na trama, o trio da Jovem Guarda passava por Japão, Israel e Rio de Janeiro em busca de uma estátua roubada e um mapa do tesouro. Em 1971, viveu o personagem Pedro Navalha em Roberto Carlos a 300 Quilômetros Por Hora.
No ano seguinte, esteve em Os Machões, ao lado de Reginaldo Faria e Flávio Migliaccio, trabalho que lhe rendeu elogios. “Cumpre retificar que a interpretação de Erasmo Carlos em Os Machões é uma das três ou quatro maiores de um ator brasileiro este ano”, consta em reportagem publicada pelo Estadão em 1º de novembro de 1972.
Ainda viriam O Cavalinho Azul (1984) e Paraíso Perdido (2018). Sua participação mais recente na dramaturgia se deu em Modo Avião, filme protagonizado por Larissa Manoela lançado pela Netflix.
Em 2019, a cinebiografia Minha Fama de Mau retratou a vida de Erasmo Carlos, com Chay Suede no papel do Tremendão. O elenco ainda contava com nomes como Gabriel Leone (Roberto Carlos), Malu Rodrigues (Wanderléa) e Bruno de Luca (Carlos Imperial).
O filme foi baseado na biografia de mesmo nome, lançada em 2009. Sobre o livro, explicava ao Estadão pouco antes do lançamento: “Não contei as maldades. A intenção era contar com humor certas histórias e curiosidades da minha vida. Quando comecei a escrever, eram casos aleatórios engraçados que aconteceram comigo sozinho, com a família, os amigos. Não tenho pudor. Eu entrego as verdades da vida”. Ele ainda ressaltava que o “mau” do título não deveria ser levado ao pé da letra: “A fama de mau agrada certo segmento de mulheres.”
Em junho de 2021, Erasmo Carlos deu uma série de entrevistas por ocasião de seu aniversário de 80 anos. Ao Estadão, contava: “Com 80, podia estar jogando cartas com os aposentados na praia. Não. Estou aqui, trabalhando. Gosto do que faço. Quis a vida que eu fosse um compositor, que eu aprendesse alguns acordes que me permitissem fazer minhas músicas. O resto é minha imaginação que faz”.
Fonte: www.correiodopovo.com.br
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