Júri condena os quatro réus pelo incêndio da Boate Kiss em Santa Maria

Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Luciano Bonilha e Marcelo de Jesus receberam habeas corpus preventivo e não sairão presos do plenário nesta sexta-feira

Foto: Ricardo Giusti

O júri do julgamento da Boate Kiss condenou, na tarde desta sexta-feira, os réus Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Luciano Bonilha e Marcelo de Jesus dos Santos pelas mortes de 242 pessoas e ferimento de mais de 600 sobreviventes no incêndio da Boate Kiss, que ocorreu em 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria. Eles foram responsabilizados levando em consideração o dolo eventual. O juiz Orlando Faccini Neto anunciou as penas de cada um dos acusados após os jurados se reunirem na sala secreta. 

De acordo com a decisão do magistrado, o regime inicial será fechado. Porém, em razão do Habeas Corpus preventivo concedido pelo Tribunal de Justiça do Estado foi suspensa a prisão imediata dos acusados nesta sexta-feira. A decisão, favorável ao advogado Jader Marques, defensor de Elissandro Spohr, que recebeu a maior pena entre os quatro, se aplica a todos. O Ministério Público e a defesa podem recorrer da sentença dada nesta sexta-feira.

Elissandro Callegaro Spohr e Mauro Londero Hoffmann eram sócios da casa noturna na época da tragédia. Marcelo de Jesus dos Santos era vocalista da Banda Gurizada Fandangueira e Luciano Bonilha Leão, o auxiliar do grupo musical que se apresentava na boate na noite do incêndio. 

Sentenças: 

Elissandro Callegaro Spohr 
Pena base: 15 anos
Pena final: 22 anos e 6 meses 

Mauro Londero Hoffmann 
Pena base: 13 anos
Pena final: 19 anos e 6 meses 

Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão
Pena base: 12 anos
Pena final: 18 anos 

Leitura da sentença 

Antes de iniciar a leitura da sentença, o magistrado disse que não a leria inteira, pois achou desnecessária. Ele falou sobre os dez dias de julgamento e elogiou a postura dos jurados e agradeceu a contribuição deles no processo. “Impossível agradecer o envolvimento que tiveram, o comprometimento com esse dever cívico que, entretanto, ficaram longe de suas famílias e não recebem nada por isso. Com uma pressão significativa dada a importância de tudo”, disse. Aos familiares, ele disse que não ia dedicar palavras, mas o seu trabalho de juiz. 

Ao longo da leitura da sentença, o juiz também citou um trecho do livro escrito sobre a tragédia escrito por Daniela Arbex, uma das sobreviventes da noite. “Todos os réus seguramente terão tempo de cultivar as suas famílias, desenvolver as suas amizades, viajar, conhecer pessoas, participar de eventos e festas, amores e desamores, nesta trajetória cheia de mistérios e maravilhas que é a vida. Nada disso caberá às vítimas”, leu. Ainda conforme a leitura de Faccini Neto, os anos de vida tiradas das vítimas da tragédia não ocorreram por “obra do acaso, um raio, um terremoto ou um furacão, trata-se de obra humana”. 

Segundo Faccini Neto, o comportamento das vítimas também foi avaliado no processo. “Em um nível comparativo, o comportamento nobre de algumas vítimas, implica o juízo desfavorável para os acusados. Vejam que mesmo no plenário, em diversas referências, muitas vítimas, após terem conseguido no local, voltaram em um ato heroico, para buscar salvar os seus semelhantes”, disse. 

De acordo com magistrado, a culpabilidade dos réus é elevada. “Quem, em um momento altruísta, por um minuto apenas, buscar colocar-se no ambiente dos fatos haverá de imaginar o desespero, a dor, o padecimento das pessoas que na luta pela sua sobrevivência, todavia, havia falta de ar, gritos e escuridão, em termos tão singulares que não seria demasiado qualificar tudo o que ali foi experimentado a modo como é assentado na literatura: o horror”, refletiu.   

O magistrado ainda mencionou sobre a presença de “pais e mães que compareceram em audiências nos plenários, chorando a morte de seus filhos”. “Isso nunca pode ser naturalizado e, mais do que isso, parece potencializado quando a experiência da morte deixa de ser algo individual para se constituir em uma dimensão coletiva. Foram mais de 240 mortes e a expressividade do número de vítimas não se arrefece ou divide as dores ou tragédias pessoais, se multiplica”, disse.  

Durante a leitura, os familiares das vítimas e sobreviventes da tragédia presentes no plenário ouviram a sentença de mãos dadas, em forma de corrente. Muitos estavam emocionados e choravam. Segundo o presidente associação de vítimas da boate Kiss, Flávio Silva, a condenação dos réus “foi uma conquista da sociedade.” Em Santa Maria, também houve comoção com o anúncio da condenação dos réus. 

Fonte: https://www.correiodopovo.com.br/