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Fiscalização de drones agrícolas é deficiente

De acordo com o Sindicato Nacional de Empresas de Aviação Agrícola (Sindag), pelo menos 80% da frota de aeronaves remotamente controladas empregadas na pulverização são aparelhos piratas com operadores sem capacitação

Tecnologia com uso de drone no campo. | Foto: Fabiano do Amaral / CP Memória

A regularização da atividade é o maior desafio enfrentado hoje pela crescente utilização de drones na agropecuária nacional. Estima-se que cerca de 36 mil aeronaves de pulverização voem atualmente sobre os campos do Brasil. Deste total, pelo menos 80% seriam aparelhos piratas, controlados por pessoas sem a qualificação exigida pela legislação do país e, principalmente, sem capacitação para lidar com a necessidade de precisão das aplicações de agrotóxicos.

A situação está diretamente relacionada a um dos temas mais polêmicos do agro gaúcho, a deriva de produtos químicos aplicados sobre lavouras, levando substâncias para áreas além do alvo previsto. Em dezembro, o tema motivou inclusive a apresentação e aprovação de um projeto de lei na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul para proteger a aviação agrícola de uma eventual proibição no estado. Fruticultores movem ações judiciais para tentar assegurar a fiscalização pelo poder público e impedir que pomares sejam contaminados por líquidos nocivos às plantas e à saúde humana.

As regras brasileiras para a operação dos drones (termo genérico originado dos Estados Unidos) como ferramenta de pulverização agrícola foram formalmente estabelecidas com a publicação da Portaria nº 298, na edição do dia 24 de setembro de 2021 do Diário Oficial da União. Emitido pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), o texto regulamenta “a aplicação de agrotóxicos e afins, adjuvantes, fertilizantes, inoculantes, corretivos e sementes”. A portaria determina que, além do registro no Mapa, os operadores devem contar com a colaboração de profissional qualificado com curso específico, designado como aplicador aeroagrícola remoto. Em determinados casos, é necessário também um responsável técnico, engenheiro agrônomo ou engenheiro florestal, para coordenar as atividades. As aeronaves devem estar regularizadas junto à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

Na prática, no entanto, as coisas funcionam de forma diferente. A falta de registro e de qualificação cresce na mesma proporção que a frota aumenta. De acordo com o diretor-executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag), Gabriel Colle, o número de drones existentes no país praticamente dobrou entre 2023 e 2024. “Estamos trabalhando muito para que o pessoal registre seu drone. Que compre e faça o registro na Anac”, diz Colle, salientando os esforços do sindicato neste sentido. A instituição representa as empresas que utilizam as aeronaves de controle remoto no país, a maioria delas operando também com aviões agrícolas.

Comparando os custos de aquisição de um drone de pulverização – entre R$ 80 mil e R$ 200 mil – com os de um trator ou de um avião, Colle avalia que a compra do aparelho ocorre quase que por impulso e por um consumidor sem conhecimento técnico.

“No avião e no trator, você não tem um curioso comprando. ‘Ah, hoje eu vou comprar um trator.’ Com o drone, você tem”, afirma o dirigente.

“O pessoal acaba comprando como oportunidade de investimento ou porque viu alguma matéria dizendo que ganha muito dinheiro, que é muito fácil de fazer isso. E aí passamos a ter problemas com aplicações (de agrotóxicos) ruins”, acrescenta.

A pirataria na atividade ganhou impulso a partir de 2022, com o ingresso de aeronaves de procedência chinesa, que entram no país tanto por importação regular quanto por descaminho, conforme relata o empresário Ulf Bogdawa, sócio-fundador da SkyDrones, empresa pioneira e única no Brasil a produzir o equipamento. “Existem empresas importadoras, mas quem desenvolve no Brasil somos nós”, garante Ulf. Até aquele ano, a produção e comercialização dos três modelos de drones pulverizadores oferecidos pela marca, de 10 litros, 30 litros e 50 litros, representavam 60% do faturamento do empreendimento. Diante da concorrência com os artefatos chineses, o percentual caiu para 10%, levando a SkyDrones a se concentrar em outros segmentos de mercado. “No Brasil, não temos nenhum tipo de facilitação para sermos competitivos e os que deveriam fiscalizar não cumprem seu papel”, diz Ulf.

Assim como o Sindag, Ulf e a empresa contribuem com o Mapa para estimular a formação de aplicadores aeroagrícolas. Desde 2019, a SkyDrones realizou cursos de capacitação que formaram mais de 800 pilotos de drones.

“É um esforço do Ministério da Agricultura para educar pessoas que não têm formação como engenheiro agrônomo ou florestal. São os engenheiros que têm a formação oficial para lidar com agrotóxicos. Se o remédio for mal usado, ele causa mais mal do que benefício”, afirma o engenheiro mecânico Ulf.

O empresário aponta outro problema decorrente da pirataria proveniente do gigante asiático. “Os drones chineses foram banidos dos Estados Unidos, da Índia e de Israel, entre outros lugares, porque, em todo voo que fazem, os dados são transmitidos para servidores que estão na China. Imagina que, no Brasil, todo voo é gravado num banco de dados na China?”, questiona. Ulf alerta para a ameaça à segurança agropecuária do país representada pela transferência de informações. “Os chineses têm todas as informações do agro brasileiro, em tempo real. Eles podem fazer o que eles quiserem. Podem comprar as áreas de maior interesse para eles, e assim por diante. Esse é o motivo pelo qual os americanos proibiram o voo de drones chineses em atividades de interesse nacional, como polícia, exército e agricultura”, diz Ulf.

Aparelho conquista espaço na labuta do campo

Tamanho e capacidade limitadas, em vez de serem empecilhos, constituem vantagens oferecidas pelas aeronaves com comando remoto, especialmente em lavouras e pomares de acesso restrito

Na lavoura, na pesquisa e na fiscalização, o emprego crescente de drones facilita, ou mesmo possibilita, o acesso às áreas de difícil atuação por outros meios. Considerando o uso na pulverização, o diretor-executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag), Gabriel Colle, situa as aeronaves remotamente controladas entre o aplicador levado pelo agricultor nas próprias costas e o avião agrícola convencional.

“Estamos vendo uma troca muito grande do costal para o drone”, diz Colle. O diretor salienta que os aparelhos, atualmente, têm capacidade de carga, considerando bateria e químicos para aplicação, de, no máximo, 50 litros, o que afasta a possibilidade de substituição do avião. “O menor avião hoje parte de 700 litros de carga. Não vamos falar que não pode ocorrer a substituição porque a tecnologia avança”, pondera Colle.

Os avanços, aliás, não devem contemplar o aumento da carga ou o tamanho do aparelho, mas, sim, a precisão e a capacidade de tomar decisões, confirmando possibilidades tecnológicas antes imaginadas em filmes de ficção científica. “O bacana do drone de pulverização não é pulverizar toda a área, mas, sim, pulverizar somente onde realmente precisa. Para economizarmos produto químico e diminuir a poluição. É agricultura de precisão”, diz o empresário Ulf Bogdawa, sócio-fundador da SkyDrones, única empresa brasileira que atua na criação e produção desse tipo de aeronave.

A aposta principal para a evolução dos aparelhos é a inteligência embarcada. “A tendência é, no futuro, os drones terem a capacidade de, durante o voo, detectarem os locais onde há algum tipo de infestação, algum tipo de doença e tratar somente aqueles lugares, usando inteligência artificial. Esse é o caminho”, explica o empresário, destacando que isso poderá contribuir para reduzir a ocorrência de problemas. “Os drones são robôs que fazem o que a gente manda. O problema é a capacitação do piloto, do técnico envolvido, dele tomar decisões erradas. Usar um produto químico inadequado para a situação ou fazer a aplicação do produto em momento errado. O problema existe por causa do operador”, avalia o engenheiro mecânico.

Além do tamanho reduzido e da possibilidade de realizar voos de baixa altura, os drones dispõem de câmeras e sensores com altíssima resolução. Com isso, fotografias e vídeos são obtidos a milímetros da planta, do animal ou do solo. “Os drones são excelentes na aplicação de insumos. Possibilitam uma distribuição uniforme, reduzem o desperdício e preservam a saúde do agricultor, pois reduzem a exposição direta aos produtos. Além disso, proporcionam maior agilidade, cobrindo grandes áreas em menor tempo, com precisão que seria impossível de alcançar manualmente”, avalia Loremberg Moraes, diretor da Hydroplan-EB, empresa que atua há 25 anos no fornecimento de polímeros, óleos essenciais e fertilizantes especiais para o setor agrícola.

A fruticultura é o segmento do agro que mais utiliza a tecnologia do drone hoje, no Brasil. Minas Gerais opera a maior frota, cujo zumbido se espalha pelos cafezais.

“O drone chega naquelas áreas que não tem como chegar de outra forma, nem de trator, nem de avião. Nos morros, em lugares de grande altitude, como a Serra Gaúcha”, diz Colle, enfatizando a adequação dos aparelhos para os parreirais gaúchos.

“São áreas pequenas, que demandam muitas aplicações e nas quais o trabalhador sofre muito na aplicação terrestre”, acrescenta.

As operações têm sido, com frequência, assumidas como complemento de atividades de empresas de aviação agrícola. “São pilotos agrícolas que têm o drone como complemento de renda. Eles não têm migração completa porque o rendimento financeiro do drone ainda é muito baixo. Em três horas, um avião consegue fazer 1,2 mil hectares. O drone, em condições ideais, vai conseguir fazer 40 hectares”, explica Colle.

 | Foto: Leandro Maciel

Ferramenta protagonista contra a gripe aviária

No Rio Grande do Sul, a defesa agropecuária e a extensão rural planejam ampliar o emprego de drones como ferramenta de importante apoio na fiscalização, no combate a doenças e na pesquisa ambiental. Em 2023, a tecnologia ganhou destaque especial no enfrentamento a um foco de influenza aviária pelo vírus H5N1, localizado em Santa Vitória do Palmar, no sul do Estado. Na época, dezenas de animais marinhos e aves silvestres foram acrescentados à contagem de mortos ou doentes em decorrência da gripe. A primeira ave infectada foi encontrada na Estação Ecológica do Taim, em maio daquele ano.

“O equipamento foi de grande utilidade porque, principalmente em regiões alagadas, não conseguíamos nos aproximar. O drone foi essencial para fazermos uma visualização das aves e inclusive para avaliar comportamento”, relembra o diretor adjunto do Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação, Francisco Lopes. Veterinário, Lopes explica que o drone permite à fiscalização analisar se uma ave se encontrava isolada no banhado por necessidade de descanso ou em razão de sofrer alguma patologia. “Temos algumas visualizações, por exemplo, de animais com sinais nervosos, que começam a nadar rodando em torno do próprio eixo, característica clara de uma infecção, de um sinal nervoso compatível com a influenza aviária”, afirma.

O departamento conta hoje com 12 drones, adquiridos desde 2021, e mais de 30 servidores, entre fiscais agropecuários e técnicos agrícolas, capacitados para operar as aeronaves. “Estamos conversando com instituições que trabalham com pesquisa de softwares, para utilizar drones na contagem de animais, com aplicativo instalado no computador, no celular ou no tablet. Facilitaria muito nossa atuação nesse tipo de atividade”, antecipa Lopes.

“O drone não é um equipamento barato, mas, pelo resultado que ele pode dar, acaba se tornando barato”, acrescenta o diretor adjunto, o qual ressalta a longa durabilidade das aeronaves.

Na Emater-RS/Ascar, o uso dos drones se encontra em estágio inicial, informa o extensionista rural Antonio Carlos Leite de Borba. A empresa dispõe de um aparelho, cujos primeiros voos ocorreram em junho de 2024. “Estamos em processo de aquisição de mais três”, diz Borba. As aeronaves são empregadas para o monitoramento ambiental. “Nas áreas de invasão do capim-annoni no bioma pampa, por exemplo. Nas áreas de campo nativo, estamos propondo a utilização do drone para avaliação do estresse hídrico, a falta ou excesso de água”, esclarece Borba.

Fonte: https://www.correiodopovo.com.br/

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