No segundo dia da sessão do Tribunal do Júri do caso do assassinato do ex-presidente do Conselho Regional de Medicina (Cremers), médico Marco Antônio Becker, a testemunha de acusação, o delegado Gustavo Fleury, destacou na manhã desta quarta-feira as provas técnicas que definiram a linha de investigação sobre os responsáveis pelo crime ocorrido em 4 de dezembro de 2008, em Porto Alegre.
Na época, Gustavo Fleury era ainda inspetor e atuou na investigação pela Delegacia de Homicídios da Polícia Civil. O trabalho investigativo foi coordenado pelo delegado Rodrigo Bozzetto, que foi ouvido na tarde dessa terça-feira e detalhou o trabalho policial realizado.
O julgamento é presidido pelo juiz federal Roberto Schaan Ferreira, da 11ª Vara Federal da Capital, e tem previsão de conclusão na próxima sexta-feira. Quatro réus estão sendo julgados por homicídio qualificado. Tratam-se do ex-andrologista Bayard Ollé Fischer dos Santos, acusado de ser o mandante do crime após ter o diploma de médico cassado; do ex-assistente dele, Moisés Gugel, que intermediou as informações da vítima; do traficante Juraci Oliveira da Silva, conhecido como Jura, acusado de planejar o homicídio; e o cunhado dele, Michael Noroaldo Garcia Câmara, apontado como um dos executores.
O crime teria sido praticado por vingança, segundo o Ministério Público Federal, pois Bayard culpava Marco Antônio Becker pela cassação do seu diploma médico. Bayard tinha Jura como um dos seus pacientes.
Em seu depoimento, o delegado Gustavo Fleury explicou que a principal atribuição dele na investigação foi a da interceptação telefônica e análise dos dados. Entre o que mais chamou a atenção dele foi uma conversa pelo telefone fixo da clínica de Bayard na qual o interlocutor disse algo parecido com “mandou matar o médico e mesmo assim foi cassado”.
“O doutor Bayard era um dos suspeitos. Na medida em que você encontra uma interceptação telefônica, onde um outro médico muito próximo a ele porque trabalhava com ele na clínica, mantém um diálogo com um terceiro e esse terceiro fala ‘mandou matar e mesmo assim foi cassado’, causou estranheza”, afirmou.
Gustavo Fleury lembrou ainda que inúmeras trocas de SMS e ligações do aparelho de Moisés Gugel com um telefone, cujo sinal vinha do complexo prisional de Charqueadas. “Esses contatos cessaram praticamente depois do homicídio”, frisou. Ele recordou que o contato era com o traficante Jura, recolhido no sistema prisional.
A investigação avançou e os policiais civis descobriram e apreenderam recortes das reportagens sobre a morte de Marco Antônio Becker no consultório de Bayard. “Não era simplesmente recortes de jornais. Nas notícias haviam círculos com caneta em algumas reportagens específicas”, contou.
Os agentes encontraram também uma pasta intitulada “Depoimento Becker” no consultório de Bayard, onde “trazia ali todos os passos, todo depoimento que ele ia apresentar para a polícia”, explicou Gustavo Fleury.
Outra pista surgida foi em relação à moto Honda Falcon, usada pelos autores do crime. A testemunha de acusação relatou que o Ministério Público do Estado repassou uma escuta telefônica no âmbito de uma apuração de tráfico de drogas. Na conversa entre duas mulheres aparece que Michael Noroaldo Garcia Câmara teria dito que seria preciso esconder uma moto.
Os policiais civis descobriram que a moto também era um Honda Falcon, com as mesmas características da vista na cena do crime, sendo usada pelo cunhado de Jura. Logo no início da investigação, destacou o delegado Gustavo Fleury, surgiu uma denúncia de que os executores seriam do Campo da Tuca, área em que atua o traficante, e que a moto estaria lá.
Uma outra interceptação telefônica apareceu quase no encerramento do inquérito. “O Moisés Gurgel estava grampeado”, salientou. Um indivíduo ligou para ele e questionou sobre “a bronca do médico” e que Jura estava indignado com o “vazamento”. Para ele, foram vários contatos suspeitos. “Então essas provas técnicas foram de fundamental importância”, concluiu Gustavo Fleury.
O Tribunal do Júri prevê os depoimentos de cinco testemunhas de acusação e 11 testemunhas de defesa. Na sequência, os réus serão interrogados. Passada esta fase, a sessão seguirá com os debates orais da acusação e das defesas. Tem a possibilidade ainda da réplica e da tréplica. E, por último, o juiz presidente se reunirá com os jurados para votação dos quesitos.
O assassinato de Marco Antônio Becker aconteceu na noite de 4 de dezembro de 2008, após sair de um restaurante na rua Ramiro Barcelos, bairro Floresta, na Capital. Na ocasião, o oftalmologista se dirigia ao seu carro, um Volkswagen Gol, quando foi atingido por tiros disparados por dois homens em uma moto. A morte ocorreu em decorrência de uma hemorragia interna provocada pelos disparos.
Em dezembro de 2013, a denúncia foi recebida pela Justiça Federal. O Superior Tribunal de Justiça interpretou que o homicídio havia sido motivado pela atuação da vítima junto ao Cremers e a sua suposta influência no Conselho Federal de Medicina, o que justificaria que o julgamento passasse a tramitar na esfera federal. Antes disso, a ação penal tramitava na Justiça do Estado.
Fonte: correiodopovo.com.br
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