Foram 44,3 mil ocorrências, que no comparativo com o mesmo período do ano passado representam diminuição de 4%
Nos seis primeiros meses deste ano, o Rio Grande do Sul registrou 44,3 mil casos de estelionato. Em média, 245 pessoas comunicaram por dia à polícia terem sido alvo de golpistas. No comparativo com o mesmo período do ano passado, o número indica retração de 4%. Foram 1,8 mil fatos a menos do que de janeiro a junho de 2021. Os dados fazem parte dos indicadores de criminalidade divulgados pela Secretaria da Segurança Pública do Estado no fim da semana passada.
Embora haja essa tendência de diminuição nos registros — nos meses de março, abril, maio e junho houve redução em relação ao mesmo período do ano passado — os números ainda são bem mais altos do que antes do início da pandemia do coronavírus. Em todo o ano de 2018, por exemplo, foram registrados 23,8 mil estelionatos no RS – quando isolamos somente o primeiro semestre, cai para 11,3 mil. Ou seja, os casos quase quadruplicaram no período.
Se olharmos para os outros anos, percebemos que 2019 apresentou cenário semelhante, com 13,6 mil golpes registrados nos primeiros seis meses. Foi em 2020 que os casos começaram a saltar, chegando ao fim do ano com 67,1 mil registros – desses, 26,2 na primeira metade. O fato de que as pessoas precisaram permanecer em casa e passaram a realizar mais atividades pela internet – sejam compras ou mesmo trabalho – tornou esse campo ainda mais fértil para os golpes e trouxe vantagens aos criminosos.
— Antigamente um estelionatário conseguia fazer um ou dois crimes num dia, por exemplo. Mas, hoje em dia, com o telefone celular na mão consegue atingir uma infinidade de vítimas — pontua o delegado André Anicet, titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic).
Além da facilidade de disseminação e de acesso ao maior número de vítimas pelas redes, o policial também ressalta a migração de parte dos criminosos para o estelionato. Diferente de outros delitos, que muitas vezes exigem investimento em armas e material humano, como os assaltos, o golpe demanda bem menos investimento financeiro, ou risco de morte, e, por vezes, resulta em altas somas para os bandidos. Não raro, os autores já estão inclusive atrás das grades e de dentro do sistema continuam praticando novos crimes.
— O conhecimento dessa prática faz com que mais criminosos acabem atuando nesse ramo. Com maior número de criminosos, eles conseguem atingir maior número de vítimas — explica Anicet.
Para tentar conter esses crimes, a polícia lançou nos últimos anos estratégias como a intensificação de campanhas de prevenção e a centralização das investigações que envolvem grupos criminosos na delegacia do Deic. O intuito é focar naquelas organizações que são responsáveis por diversos casos de estelionato. Mas a apuração desse tipo de crime também encontra dificuldades, desde a alta incidência de casos, como os recursos que são usados pelos próprios golpistas para esconder suas verdadeiras identidades.
Muitas vezes quem está por trás do celular utiliza conta de telefone criada por meio de dados falsos ou de outra pessoa. Como destino dos valores obtidos com a trapaça em geral estão contas bancárias de laranjas – pessoas que são cooptadas pelos criminosos para emprestar ou alugar as contas ou que, em algumas vezes, sequer saber que estão tendo o nome usado.
— Há ainda a facilidade de transferências bancárias, através do Pix (que agilizam o recebimento dos valores e dificultam o resgate, quando a vítima se dá conta). São fatores que fazem com que se tenha maior número de vítimas e de criminosos praticando esse tipo de crime — diz o delegado.
Prevenção e subnotificação
Além das investigações e operações contra grupos envolvidos nos golpes, outros fatores se somam à redução dos indicadores. Um deles é a subnotificação, que acaba mantendo oculta uma cifra de casos, que não chegam ao conhecimento da polícia. E outro é a prevenção, que são as diversas tentativas de alertar as vítimas para que não caiam nas trapaças.
— Quando o usuário, a vítima, não se atenta às armadilhas proporcionadas pelos criminosos, não tem cuidado, acaba clicando em tudo que aparece, fazendo o que eles pedem, e caindo na engenharia social que os criminosos praticam. Acho que a principal dificuldade na contenção é essa. Sempre digo que a principal dica é desconfiar — afirma o delegado Anicet.
Apesar da divulgação dos casos, os tipos de trapaças mais aplicadas já são velhos conhecidos das polícias. Entre eles, estão o golpe do falso leilão, o golpe dos nudes, o hackeamento de contas do Instagram para venda de objetos pelos stories, o golpe da falsa central telefônica e as contas falsas de WhatsApp.
Ainda em janeiro, a advogada Janaína Palma, moradora de Porto Alegre, foi procurada por uma tia, querendo saber se ela havia entrado em contato com o primo e se estava precisando de dinheiro. Foi quando descobriu que alguém estava usando a mesma fotografia que ela mantém no WhatsApp, mas com um outro número. O golpista havia feito contato com o familiar se passando pela advogada e alegando que precisava de R$ 7,8 mil para fazer um pagamento, mas que seu limite diário de transferências havia excedido.
— Não sei de onde eles pegaram a minha foto. Acredito que de algum grupo de WhatsApp que entrei, por conta de algum evento. Alguém teve acesso de algum jeito e clonou — afirma Janaína.
Desconfiado, o primo não chegou a fazer o pagamento. “Já te transferi R$ 10 mil hoje de manhã. Não deu?”, brincou com os criminosos, que desistiram da empreitada. No meio da tarde, quando o marido dela tentou contato com o mesmo número, já havia a foto de outra pessoa. Uma das preocupações da advogada ao saber do episódio foi que os criminosos fizessem contato com algum cliente do escritório, o que acredita que poderia atingir sua imagem.
— Imagina se pedem dinheiro para um cliente meu, que vergonha. Foi a primeira coisa que pensei. É uma sensação de invasão — descreve.
Janaína publicou o fato em suas redes sociais e, mesmo sem ter prejuízo financeiro, registrou o caso por meio da Delegacia Online – esta é a orientação da Polícia Civil para que se possa ter uma dimensão real do número de casos que vêm ocorrendo. Ela também entrou em contato por telefone com o pai e a avó para deixá-los em alerta.
Como os golpistas usaram a mesma foto que ela mantinha no perfil profissional, após o fato a advogada ativou a verificação em duas etapas, como tentativa de se proteger de uma possível captura de conta – outro golpe semelhante no qual os estelionatários conseguem ter acesso ao número de WhatsApp da vítima.
— Sei que não é suficiente. Sempre arranjam uma nova forma (de aplicar golpes). Fiquei mais cuidadosa. Muitos amigos meus têm passado por este tipo de golpe — afirma.
Confira outras dicas
- Golpistas, em geral, oferecem vantagens para atrair a vítima e têm pressa para obter lucro. Fique atento a isso
- Não envie dados pessoais ou cópias de documentos para desconhecidos
- Se estiver acertando qualquer tipo de aluguel, seja por temporada ou permanente, visite o imóvel antes de fechar o negócio
- Na hora de comprar algo pela internet, desconfie se o site só aceitar pagamento por boleto ou transferência, se tiver falhas ou erros na página e se o único contato for por WhatsApp
- Desconfie de publicações na internet que ofereçam serviços e bens por um valor abaixo do preço de mercado
- Não adquira produtos pela internet sem antes se certificar de quem está vendendo. Mesmo que seja um perfil conhecido, só efetue o pagamento após conversar diretamente com a pessoa
- No momento do pagamento, seja por Pix ou transferência, confira se o nome do destinatário é o mesmo de quem está adquirindo o produto
- Não repasse códigos recebidos no celular, por exemplo. Essa é uma das principais estratégias usadas para hackear contas no WhatsApp e no Instagram
- Certifique-se de que a pessoa com quem você está conversando, por WhatsApp, por exemplo, é ela mesma. Para isso, uma dica é telefonar para a pessoa
- Desconfie de ligações de desconhecidos e nunca repasse informações pessoais
- Durante a venda de algum item, só entregue o produto após o dinheiro entrar na conta ou receber o valor. Não confie em comprovantes de transferência porque eles podem ser falsificados
- Se tiver um familiar idoso, oriente a pessoa sobre os golpes mais comuns e como se prevenir deles
- Caso seja vítima, registre a ocorrência. É possível utilizar a Delegacia Online. Reúna todas as informações que podem servir como provas, como dados bancários, conversas por mensagens e fotografias
Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/
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