
A Secretaria Estadual da Saúde (SES) realizou um seminário voltado ao enfrentamento e ao controle do escorpião-amarelo (Tityus serrulatus), espécie que tem se disseminado em áreas urbanas do Estado e que representa risco à saúde pública. O evento foi promovido pelo Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs) da SES e reuniu cerca de 150 técnicos e gestores municipais, especialmente da Região Metropolitana, na sede da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), em Porto Alegre.
O objetivo do encontro foi fortalecer a articulação entre os níveis estadual e municipal, promovendo o aprimoramento das ações locais. A programação incluiu palestras técnicas, relatos de experiências locais e debates com especialistas.
Escorpião-amarelo
O escorpião-amarelo é altamente adaptável ao ambiente urbano, reproduzindo-se em locais como ralos, encanamentos, entulhos e frestas de paredes. Sua picada pode causar envenenamento grave, especialmente em crianças e idosos. Desde 2013, 47 municípios gaúchos reportaram a presença da espécie, com destaque para Porto Alegre, Sapucaia do Sul, Esteio e Três de Maio, que realizam busca ativa semanal. Neste ano, também foi identificado em Porto Alegre o Tityus stigmurus, espécie semelhante ao escorpião-amarelo, com características morfológicas e toxicológicas parecidas.
Acidentes e atendimento
De acordo com o Centro de Informação Toxicológica do RS (CIT/RS), foram registrados 58 acidentes com escorpião-amarelo no Estado desde 2020, sendo 14 em 2024 e três em 2025. Não houve óbitos até o momento. O atendimento é realizado em hospitais de referência, com disponibilização de soro pela vigilância epidemiológica da SES. O CIT/RS mantém plantão 24 horas pelo telefone 0800-721-3000.
Riscos e estratégias de controle
Um dos palestrantes do seminário foi o biólogo Cláudio de Souza, do Instituto Vital Brazil (RJ), instituição reconhecida nacionalmente como centro de referência em saúde pública voltado ao estudo de animais peçonhentos. Em sua apresentação, ele abordou estratégias de controle do escorpião-amarelo e alertou para a complexidade do problema.
“O escorpião não é um problema trivial. Trabalhamos hoje para desenvolver abordagens mais eficientes que possam diminuir os riscos ao mínimo, mas sabemos que não é algo que possamos eliminar”, frisou. O especialista também destacou fatores que favorecem a proliferação da espécie, especialmente em áreas urbanas. “O principal vetor de proliferação do escorpião é a atividade humana, por questões como o urbanismo e a distribuição de alimentos. Isso cria um ambiente extremamente favorável ao animal”, explicou.
O pesquisador Ricardo Ott, da Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema), contribuiu com informações sobre a biologia e a ecologia dos escorpiões. Segundo ele, o escorpião-amarelo não é nativo do Rio Grande do Sul, ao contrário de outras espécies do mesmo gênero, mas já está estabelecido no Estado. “O escorpião conseguiu se adaptar muito bem a espaços urbanos, saindo de habitats como pequenas cavernas e palmeiras. Nas cidades, eles encontraram nas redes de esgoto um ambiente com disponibilidade grande de alimentos, em especial as baratas, e sem predadores”, detalhou Ott.
O primeiro registro do escorpião-amarelo no RS foi em 2001, em Porto Alegre, quando houve um acidente com um trabalhador da Central de Abastecimento do Rio Grande do Sul (Ceasa/RS). A chegada do animal ao Estado por transporte de alimentos é uma das principais hipóteses aceita pelos especialistas.
Representando o CIT/RS, a bióloga Kátia Moura abordou os efeitos do veneno do escorpião no organismo humano. Ela explicou que o veneno ataca o sistema nervoso autônomo, provocando sintomas locais como dor, parestesia (formigamento), sudorese profusa (produção excessiva de suor) e piloereção (arrepio dos pelos).
Os casos mais graves costumam apresentar problemas digestivos, cardiovasculares, respiratórios e neurológicos, ao passo que os óbitos costumam ser causados por complicações como ataque cardíaco grave (choque cardiogênico) e edema pulmonar (acúmulo excessivo de líquido nos pulmões). “Quanto mais cedo a pessoa receber atendimento médico e o soro, se esse for o resultado da avaliação, menor a chance de uma evolução mais grave”, afirmou Kátia.
Medidas de prevenção
O escorpião-amarelo não é agressivo por natureza. Ele ferroa apenas como forma de defesa, geralmente quando é tocado ou molestado, seja de forma intencional ou acidental. Por isso, é importante redobrar a atenção ao manusear objetos e ao circular por ambientes escuros e úmidos.
A principal estratégia para o controle da espécie envolve ações de limpeza e organização dos ambientes. Terrenos baldios, quintais e jardins devem ser mantidos livres de entulhos, folhas secas e lixo, que devem ser acondicionados em sacos plásticos bem fechados. Como os escorpiões se alimentam principalmente de baratas, é essencial eliminar os locais que favorecem a presença desses insetos.
A disponibilidade de água é um fator decisivo para a sobrevivência do escorpião. Mesmo sem alimento, ele pode permanecer escondido por mais de um ano se tiver acesso à água da chuva ou ao gotejamento de canos. Além disso, a espécie mantém sua capacidade reprodutiva por longos períodos, mesmo em condições adversas.
Outras medidas importantes incluem:
- Vedação de fossas sépticas, muros e paredes externas, evitando frestas e vãos;
- Instalação de telas em ralos, pias e tanques;
- Vedação de soleiras, rodapés soltos e pontos de energia e telefone;
- Manutenção de portas bem ajustadas ao batente e sempre fechadas.
A preservação dos predadores naturais também contribui para o controle da população de escorpiões. Aves noturnas, como corujas e joão-bobos, além de sapos, lagartos, gambás, quatis e pequenos macacos são aliados importantes nesse processo.
O uso de inseticidas não é recomendado, pois pode provocar o desalojamento dos escorpiões, aumentando o risco de acidentes. Além disso, esses animais possuem mecanismos que dificultam a ação dos venenos, como a capacidade de permanecer em abrigos por longos períodos e de fechar suas aberturas respiratórias.
A Divisão de Vigilância Ambiental do Cevs orienta que a captura mecânica dos escorpiões deve ser realizada exclusivamente por profissionais habilitados. A busca ativa é uma medida de controle populacional e deve ser feita em duplas, com o uso de equipamentos de proteção individual, como botas ou sapatos fechados, calça comprida, camisa de manga com punho justo e luvas de raspa de couro. Operações de captura são realizadas, muitas vezes, à noite com o uso de luz negra, visto que os escorpiões-amarelos brilham sob a luz ultravioleta.
Cuidados recomendados à população
- Examinar roupas, inclusive de cama, calçados, toalhas e tapetes antes de usar;
- Utilizar luvas e calçados fechados ao manusear materiais de construção, lenha ou pedras;
- Manter berços e camas afastados das paredes, evitando que roupas de cama encostem no chão;
- Ter atenção especial ao se aproximar de locais escuros, úmidos ou com presença de baratas.
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