
Um comércio clandestino de logins e senhas de advogados virou atalho para quadrilhas entrarem em sistemas eletrônicos da Justiça, vasculharem processos, coletarem dados sensíveis e, a partir daí, aplicarem o golpe do falso advogado. Segundo dados citados por seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), os prejuízos estimados para brasileiros nos últimos três anos passam de R$ 2,8 bilhões em cerca de 15 mil casos relatados à Ordem.
A reportagem exibida pelo Fantástico localizou vítimas e identificou anúncios que oferecem o esquema nas redes sociais. Com o login de advogados legítimos, os criminosos acessam o Processo Judicial Eletrônico (PJe), baixam procurações, petições e decisões, e entram em contato com as partes envolvidas — geralmente pessoas idosas ou em busca de benefícios judiciais — fingindo ser seus representantes.
Diante da escalada dos casos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou novas medidas de segurança nos sistemas processuais eletrônicos. A partir de novembro, todos os advogados deverão utilizar autenticação em dois fatores, via aplicativo, para acessar o Processo Judicial Eletrônico e outras plataformas do Judiciário.
O objetivo é dificultar o uso de logins e senhas roubadas e impedir que terceiros consigam acessar os processos sem o dispositivo físico do advogado. No Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região, por exemplo, a medida entra em vigor dia 3 de novembro.
Golpista oferece serviços
Um dos golpistas que vende as credenciais afirmou, em mensagens obtidas pela reportagem, que envia um link para baixar um aplicativo que permite os acessos. O custo, incluindo login e senha roubados de um advogado, é R$ 500.
“Ele (o aplicativo) vai instalar automaticamente quando tu estiver executando, vais realizar toda a instalação no PC”, disse o criminoso, em mensagem de áudio de visualização única.
Em julho, o Departamento Estadual de Repressão aos Crimes Cibernéticos deflagrou a terceira fase de uma operação que prendeu um golpista, no Espírito Santo, que negociava credenciais de advogados.
O homem preso é apontado como um dos principais fornecedores de senhas e logins. A operação também prendeu outras nove pessoas.
Um dos casos apurados pela reportagem de uso criminoso das senhas aconteceu em Parobé. A advogada Leandra Wichmann representa uma viúva que buscava a pensão do marido falecido. A cliente recebeu uma ligação de um suposto integrante do escritório de Leandra e, acreditando falar com a advogada, acabou transferindo R$ 255 mil ao longo de nove depósitos, após ser convencida de que o dinheiro serviria para liberar o valor do processo.
— Me chamaram para uma conversa, e eu achava que era a minha advogada falando comigo — contou a vítima.
A fraude só foi descoberta depois que Leandra verificou acessos indevidos ao processo e constatou que arquivos de suas petições e da procuração haviam sido usados pelos golpistas para enganar a cliente. Senhas de um advogado do Paraná foram utilizadas para acessar as peças processuais minutos antes de a mulher receber mensagem dos falsários.
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