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Porta de saída para a pobreza no campo

Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais orienta populações rurais vulneráveis a encontrarem meios para melhorar seu sustento

Nas enchentes de maio, a Divisão de Quilombolas e Indígenas da SDR se uniu a outros órgãos de governo e da sociedade para arrecadar e enviar  mantimentos às principais comunidades impactadas, atendendo mais de 50 comunidades indígenas e quilombolas | Foto: SDR Divulgação / CP

Mesmo com problemas na coluna, Juares Vieira da Silva costumava sair de sua terra com dois sacos de milho em um carrinho de mão e ir até um moinho para moer os grãos. Ele pagava pelo serviço e não tinha muita perspectiva, na localidade de Fundo do Formigueiro, parte da Comunidade Quilombola Maria Joaquina, no município de Formigueiro. Sua realidade começou a mudar a partir da visita da extensionista rural e social da Emater/RS-Ascar Neusa Maria Pires Lorentz. Silva foi enquadrado no Programa de Fomento, foi orientado a montar um projeto produtivo, recebeu recursos para investir na aquisição de um triturador, sementes, adubo, ureia, material para construir galinheiro e chiqueiro e uma prensa para banha e torresmo. “Com isso, melhorei a lavourinha e agora planto mais, tenho comida para criar mais galinhas e porcos e vendo feijão, galinha, ovos e milho quando sobra”, conta o agricultor.

Silva integrava uma estatística que é invisível aos olhos urbanos e pouco lembrada em um Rio Grande do Sul que é protagonista na produção agropecuária e reconhecido por historicamente abrir fronteiras agrícolas Brasil afora. A pobreza no meio rural gaúcho faz com que o Estado tenha 207 mil famílias rurais inscritas em diferentes categorias do Cadastro Único (CadÚnico), registro que engloba famílias de baixa renda para inclusão em programas assistenciais e de distribuição de renda. A pobreza no meio rural gaúcho representa cerca de um terço das 683,17 mil famílias em vulnerabilidade social que receberam o Bolsa Família no mês de setembro no Estado. O valor médio do repasse federal foi de R$ 684,27, perfazendo R$ 462 milhões para atender 497 municípios. Considerando uma média de três pessoas por família, foram mais de 2 milhões de pessoas atendidas – quase 19% da população gaúcha.

Paradoxo nacional

A pobreza nacional é um paradoxo para uma nação que se orgulha de exportar alimentos e ser considerada o celeiro do mundo com maior potencial de aumentar a produção, pela disponibilidade de terras e pelas condições climáticas. Mas a realidade tem contraponto. Desde 2011, o país conta o Programa de Fomento às Atividades Produtivas Rurais, iniciativa que concilia transferência de recursos e acompanhamento técnico e social para pessoas pobres do meio rural.

No Estado, a Emater/RS-Ascar trabalha para identificar, diagnosticar e orientar a organização de projetos produtivos para pessoas como Silva. O atendimento já chegou a cerca de 30 mil famílias desde 2011.

“Há pessoas em bolsões de pobreza que estão invisíveis porque não estão no CadÚnico. Temos vulnerabilidade maior em comunidades indígenas e quilombolas, e a política pública do Programa de Fomento vai na perspectiva de emancipação, com pessoas que vão saindo da invisibilidade”, afirma a antropóloga e extensionista da Emater/RS-Ascar Mariana Soares.

Conforme Mariana, o programa abrange indígenas, quilombolas, agricultores, pescadores, assentados da reforma agrária, ribeirinhos e extrativistas, entre outros. “Quando se fala do agro, estamos falando de culturas e produção, não de pessoas, mas a Emater trabalha a partir das pessoas, famílias e suas vulnerabilidades”, esclarece. O Programa Fomento às Atividades Produtivas Rurais foi criado por lei federal, para auxiliar na estruturação de atividades que garantam segurança alimentar e contribuam para gerar renda a esse público.

“Temos hoje um perfil rural que não é eminentemente agrícola, do ponto de vista do desenvolvimento de atividade agrícola, mas muitos prestadores de serviço, que fazem capinas, colheitas e atividades complementares. Ele reside no meio rural, mas não tem terra e não desenvolve atividade própria”, esclarece a antropóloga.

A própria separação entre urbano, rural e periurbano se altera conforme o município. “Mesmo nas situações de carência, uma coisa muito manifesta é que as pessoas querem continuar morando no meio rural, apesar de todas as precariedades e falta de oportunidades”, diz Luiz Fernando Fleck, assessor do Departamento de Desenvolvimento Agrário, Pesqueiro, Aquícola, Indígenas e Quilombolas (DDAPA) da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR). A SDR é a pasta responsável por articular e executar políticas públicas para a agricultura familiar e públicos especiais como indígenas, quilombolas, pescadores artesanais e outros.

Apoio aos flagelados

Nas enchentes de maio, a Divisão de Quilombolas e Indígenas do DDAPA se uniu a outros órgãos de governo e da sociedade para arrecadar e enviar mantimentos às principais comunidades impactadas. Mais de 50 comunidades indígenas e quilombolas foram atendidas emergencialmente com cestas básicas, água, colchões, cobertores, agasalhos e kits de higiene e limpeza.

Para Fleck, a pobreza rural é formada por um “público invisível” que vive em municípios pequenos, abaixo de 10 mil habitantes, que compõem cerca de 70% dos 497 municípios gaúchos. “Provavelmente nesses pequenos municípios as pessoas se conhecem, mas fica uma espécie de incômodo, não há a crença de que essas pessoas em vulnerabilidade sejam cidadãos, com direitos e que podem progredir se tiverem oportunidades”, afirma. Em geral, quem vive no meio urbano tem uma visão ufanista do agro e focada apenas em suas culturas de produção, performance exportadora ou inovações tecnológicas que ampliam a produtividade. “Mas o rural é composto muito além de uma lavoura de soja”, alerta Fleck.

Fonte: https://www.correiodopovo.com.br/

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