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Estudo da ONU aponta que RS entrou na rota internacional do tráfico de drogas

Em 2020, PRF registrou no Estado o maior número de apreensões envolvendo cocaína no país; para a PF, peso foi recorde em 2021

Fonte: Polícia Federal / Divulgação

Pelotas, 16 de novembro de 2021. Policiais federais entram numa residência na área central da cidade e deparam com 2,7 toneladas de cocaína, além de 125 quilos de lidocaína e 250 quilos de cafeína, utilizadas para aumentar o volume da droga vendida nas ruas. É a maior e mais valiosa apreensão desse tipo de entorpecente na história do Rio Grande do Sul.

A investigação mostra que o produto, já embalado em bolsas à prova d’água, seria embarcado no porto de Rio Grande, o mais movimentado do sul do Brasil. O destino era a Europa. Lá, essa cocaína, depois de chegar às ruas, valeria cerca de R$ 675 milhões.

Não é um episódio isolado. Um trabalho estratégico de pesquisadores ligados à Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado em dezembro, mostra que o Rio Grande do Sul deixou de ser periférico para virar ponta de lança no tráfico de drogas entre o Brasil e outros países.
O trabalho, com 200 páginas, se intitula “Covid-19 e tráfico de drogas no Brasil: a adaptação do crime organizado e a atuação das forças policiais na pandemia”. 

A análise traz revelações surpreendentes. Entre elas, a de que o Rio Grande do Sul ocupou o primeiro lugar no ranking de apreensões de cocaína feitas pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em 2020. Em plena pandemia, o número de ações contra esse tipo de droga, feitas pelos patrulheiros federais, praticamente triplicou no RS: foram 197 em 2020, contra 72 em 2019 (veja abaixo).

O curioso é que essa liderança não é proporcional à população, já que os gaúchos estão em sexto lugar no ranking populacional. Para a PRF, a explicação é de que, além do consumo interno, gaúchos estão no caminho da exportação da droga para outros países.

Recorde de apreensões

E 2021 confirma essa tendência. O ano ainda não tinha terminado e a PRF já contabilizava ao menos 255 ocorrências por tráfico no RS. Essas ações resultaram num recorde de apreensões de drogas, superando em 800 quilos a quantidade de 2020, referencial anterior – e quase o dobro de 2019. Foram 31,6 toneladas de entorpecentes apreendidos em 2021, maior quantia da história da PRF no Estado. 

A apreensão nem sempre está relacionada a fluxo de droga. Ela pode ser resultado de incremento de efetivos e ações policiais, ressalta o levantamento. A Polícia Federal (PF) e a PRF, por exemplo, endossam o programa Vigia (Programa Nacional de Segurança nas Fronteiras e Divisas, do Ministério da Justiça), que já apreendeu 1,2 mil toneladas de drogas em dois anos e meio de atuação.

Aposta em rotas rodoviárias

O trabalho indica que os traficantes apostaram mais em rotas rodoviárias, em detrimento de outros modais, como aéreo e aquático. Afinal, com a pandemia, o número de voos comerciais no país foi reduzido, especialmente do Brasil para o Exterior. Ações do tráfico caíram muito nos aeroportos do Nordeste, que lideravam o envio de drogas rumo à Europa.

— O tráfico tem demanda certa. Como ocorreu baixo deslocamento social em aeroportos, parece ter acontecido interiorização das rotas, e aí entra o caso do sul do Brasil. Uma estratégia alternativa ao tradicional eixo Paraguai-Paraná-São Paulo. Das estradas, a droga é embarcada em navios para outros países e continentes — diz Gabriel Andreuccetti, coordenador do Centro de Excelência para a Redução da Oferta de Drogas Ilícitas (CdE), que fez a análise.

O CdE é um projeto de cooperação técnica internacional que congrega especialistas do escritório da ONU sobre drogas e crime (UNODC, que tem sede em Viena, na Áustria, ao qual está ligado Andreuccetti) e da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos, do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senad/MJSP).

O levantamento do CdE/UNODC ressalta o uso dos portos de Rio Grande (no RS), Joinville e Itajaí (SC) para tráfico internacional. Um exemplo dessa diversificação de rotas ocorreu em 21 de setembro de 2021. Um barco de pesca catarinense foi apreendido pela Brigada Militar no canal que liga a Lagoa dos Patos ao mar, em Rio Grande. Carregava 500 quilos de cocaína.

Aviões pequenos também são utilizados

Embora evitando aeroportos comerciais, os traficantes não abandonaram o uso dos céus. Buscam pistas particulares pequenas. Um exemplo é o acidente que envolveu um avião a hélice em dezembro de 2020, em Muitos Capões, cidade próxima a Vacaria, norte do Rio Grande do Sul. Ele estava carregado com cocaína. 

A investigação que se seguiu levou a Polícia Federal (PF) a apreender outras sete aeronaves, que seriam usadas por traficantes para trazer droga da fronteira paraguaia ao RS. Uma espécie de força aérea do tráfico. Mas outros modais também são utilizados.

— O Brasil, além de grande mercado consumidor, serve como rota para o tráfico internacional por meio de portos. Nosso país possui grande capacidade econômica, com grande fluxo de cargas transportadas por navios. No fluxo de mercadorias legais, organizações buscam inserir o transporte clandestino de drogas para abastecer os mercados de outros continentes — analisa Cleberson Alminhana, chefe da Delegacia de Repressão a Entorpecentes da PF no RS.

As quantias apreendidas pela PF no Rio Grande do Sul também aumentaram. Em 2020, foram 12 toneladas de drogas, sendo 10 de maconha. Já em 2021, foram 19,1 toneladas de drogas confiscadas (13,9 de maconha). 

Os federais avaliam que, via de regra, maconha é para consumo doméstico e países fronteiriços, enquanto grandes quantias de cocaína se destinam prioritariamente à Europa.
O estudo conjunto da ONU e do Ministério da Justiça confirma isso, ao falar que “é possível inferir a existência de uma nova rota para o tráfico de cocaína e maconha que conecta o Estado do Rio Grande do Sul e o Uruguai”.

Algo que os policiais já sabiam, mas que agora vem tabulado. “O incremento dessa nova rota pode ser atribuído à facilidade de acesso às redes de transporte terrestre entre os dois países. E à proximidade dos portos marítimos, como alternativa para evitar esforços de interdição nos principais portos do Nordeste e Sudeste do país – historicamente identificados pelas forças de segurança como instalações de alto risco para o tráfico”, enfatiza o estudo.
O texto ressalta que o RS “tem se inserido (…) como polo atrativo do tráfico internacional” também em razão das facções criminosas gaúchas, que começam a ter penetração, em parte, nacional.

Fonte: https://gauchazh.clicrbs.com.br/

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