Estudo da UFRGS aponta ligação entre vírus da zika e doenças como Alzheimer e Parkinson

Resultado pode colaborar para a prevenção e o diagnóstico das condições neurológicas e para o tratamento de pessoas infectadas com o zika.

Resultado pode colaborar para a prevenção e o tratamento de pessoas infectadas com o Zika. — Foto: US Department of Agriculture/Digulgação

Um estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) apontou a ligação entre a infecção por zika e diversas outras doenças cerebrais, como Alzheimer, autismo, esclerose lateral amiotrófica, esquizofrenia e Parkinson. A pesquisa foi publicada no fim de outubro na revista científica Molecular Neurobiology.

“É a primeira evidência. Como são doenças que ocorrem mais tardiamente no desenvolvimento, é importante para, por exemplo, contribuir com um rastreio clínico preventivo e estudos mais aprofundados para ver se estes desfechos podem de fato ocorrer associados à infecção por zika”, explica o professor da Faculdade de Farmácia da UFRGS Walter O. Beys da Silva, um dos autores do estudo.

Apesar de preliminares, os resultados apontam novos alvos de estudo para a infecção, podendo colaborar para a prevenção e o diagnóstico dessas condições neurológicas e para o tratamento de pessoas que tenham sido infectados com o zika.

Até agora, a infecção pelo vírus era relacionada a complicações neurológicas como a microcefalia em recém-nascidos e a síndrome de Guillain-Barré.

“Em adultos esse feito é menos conhecido ainda. Muito pouco tem se feito a isso. O que a gente sabe são os sintomas, como outras viroses como a dengue, a chikungunya, a febre amarela. Muitas pessoas infectadas por zika não desenvolvem sintomas. Essa pesquisa abre uma porta muito importante para a gente responder essa pergunta: ‘O que ele causa em adultos?’ É uma incógnita muito grande”, avalia o professor.

A pesquisa foi iniciada em 2017 na UFRGS e no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e contou com a colaboração do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul e dos institutos de pesquisa americanos Sanford Burhan Prebys Medical Discovery Institute e Scripps Research. O grupo de pesquisa é coordenado pelo professor do Departamento de Bioquímica da UFRGS Diogo Souza.

Os cientistas infectaram experimentalmente células-tronco humanas com o vírus da zika e avaliaram a infecção. “A partir da comparação com controle não-infectado, a gente enxergou um efeito bastante drástico na expressão de proteínas, como efeito da infecção. Ele [o vírus] vai tentar se beneficiar alterando de maneira mais coordenada essa infecção. O resultado concreto foi que várias rotas metabólicas, vários processos moleculares estão alterados, que vão promover parte desses processos drásticos em seres humanos”, explica Silva.

Segundo os pesquisadores, infecção do vírus em células-tronco humanas resulta em uma drástica alteração na expressão das proteínas desse tipo celular. Todas as proteínas identificadas nesse processo foram comparadas com as informações de um banco de dados específico de patologias humanas, para verificar quais delas também são encontradas em outras doenças neurológicas.

Os cientistas procuraram por correlações com 30 distúrbios diferentes, tendo identificado 74 proteínas implicadas em 16 neuropatologias (das quais, seis já eram associadas à infecção por zika, como a microcefalia e a epilepsia).

O maior número de proteínas atribuídas a patologias já associadas a esse vírus foi encontrado na microcefalia, com 13 proteínas em comum. Já entre as enfermidades não previamente relacionadas àquela infecção, então a esclerose lateral amiotrófica, com 23 proteínas, seguida pela esquizofrenia (14), pela doença de Alzheimer (7) e pelo Parkinson (7).

“Além disso, esse link molecular pode embasar um rastreamento clínico preventivo dos indivíduos infectados, não só crianças, mas também adultos. Muitas pessoas, principalmente crianças nascidas a partir de 2015 e que foram infectadas por zika durante a gestação, estão atualmente sob acompanhamento médico para avaliação da extensão, ao longo do desenvolvimento, dos danos neurológicos ainda desconhecidos”, esclarece Silva.

Sobre o vírus da zika

A recente epidemia do vírus da zika ocorrida no Brasil foi primeiramente associada com o surto de microcefalia em recém-nascidos, em 2015, principalmente na Região Nordeste. Posteriormente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou estado de emergência global com a constatação da rápida disseminação desse vírus e o relato crescente de problemas neurológicos congênitos em diversos países ao redor do mundo.

Com a intensificação dos estudos, outras complicações neurológicas, como a síndrome de Guillain-Barré e a epilepsia, foram associadas como consequência da infecção desse vírus, transmitido principalmente pela picada do mosquito Aedes aegypti.

Fonte: G1